INTRANET
Escrito por: Divisão de Biblioteca e Acervo Histórico 19/01/2024

A evolução do voto e da elegibilidade na Alesp (1835-2024)

 

 

A primeira Constituição brasileira, outorgada pelo Imperador D. Pedro I em 1824, já havia reconhecido o direito dos cidadãos de intervir nos negócios de suas respectivas localidades, por meio dos Conselhos Gerais de Província - órgãos consultivos que elaboravam o orçamento e as proposições legislativas que diziam respeito à província. Entretanto, seria apenas com o advento das Assembleias Legislativas Provinciais, criadas pelo Ato Adicional de 12 de agosto de 1834, que se poderia falar na existência de um Legislativo Paulista autônomo, com poder decisório e iniciativa de criação de leis em temas como saúde, instrução e obras públicas, entre tantos outros campos de atuação.

Entre 1835, ano de sua sessão inaugural, e 1889, a Assembleia Legislativa Provincial de São Paulo funcionou ininterruptamente. Foram ao todo 27 legislaturas, cada qual constituída por 36 deputados eleitos para um mandato de dois anos. O voto, ao longo de todo o período imperial, possuiu caráter censitário, o que significa dizer que era preciso possuir certo nível de renda para poder participar do processo, seja como eleitor ou como candidato. Até 1881, ano de promulgação da Lei Saraiva, que instituiu o voto direto, a escolha dos parlamentares dava-se por um sistema indireto, formado por duas etapas: as eleições paroquiais e as eleições provinciais.

De acordo com a Constituição de 1824, podiam votar nas eleições paroquiais todos os cidadãos brasileiros no gozo de seus direitos políticos, bem como os estrangeiros naturalizados, maiores de vinte e cinco anos de idade, com renda líquida anual de cem mil réis por bens de raiz, indústria, comércio ou emprego. Já para ser eleitor de província, a renda anual exigida era de duzentos mil réis. Além disso, estavam excluídos dessa segunda etapa os libertos e os criminosos pronunciados em querela ou devassa. Por fim, para poder ser escolhido deputado pelos eleitores de província, o candidato deveria ter renda de quatrocentos mil réis, não poderia ser naturalizado e deveria professar a religião do Estado (católica). Em 1846, um decreto dobrou os valores de renda anteriormente vigentes, elevando a exigência inicial para duzentos mil réis anuais. Embora não haja menção textual à exclusão das mulheres, elas não eram consideradas cidadãs - razão pela qual não podiam votar ou ser eleitas.

Com a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, as Assembleias Legislativas Provinciais deixaram de existir. A nova Constituição brasileira, de 1891, transformou as províncias em estados com autonomia constitucional. Em São Paulo, a Constituição estadual de 14 de julho de 1891 criou o Congresso Legislativo do Estado de São Paulo, órgão bicameral formado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado.

Embora as regras afins tenham sido modificadas, o caráter excludente das eleições durante a chamada República Velha não diferia muito do Império. Se, por um lado, o voto deixou de contemplar o elemento censitário, por outro se estabeleceu a barreira da alfabetização - só participava do sufrágio quem soubesse ler e escrever. Mendigos, praças de pré (militares de mais baixa hierarquia) e religiosos de ordens monásticas, companhias, congregações e comunidades também eram impedidos de votar. O conceito de cidadão incluía o indivíduo maior de 21 anos de idade no pleno gozo de seus direitos civis e políticos. As mulheres permaneciam alijadas do cenário eleitoral.

Os critérios de elegibilidade para o Congresso Legislativo estavam elencados na Constituição do Estado de São Paulo, também de 1891. Era preciso ter os direitos políticos e estar qualificado como eleitor; ter domicílio no Estado nos três anos anteriores ao pleito; não exercer autoridade que se estenda sobre todo o território do Estado; não exercer função no Poder Judiciário. As duas últimas exigências foram removidas em 1905. O tempo de domicílio passou para quatro anos e, em 1911, também foi descartado como condição de elegibilidade.

Com a deposição do presidente da República, Washington Luís, e a ascensão ao poder de Getúlio Vargas, na chamada Revolução de 1930, o Congresso Legislativo do Estado de São Paulo foi definitivamente fechado. Os paulistas somente voltariam a votar em deputados estaduais quatro anos mais tarde, em 1934. A principal inovação dessas eleições, em termos de ampliação da cidadania, foi a participação das mulheres, que passaram a votar e a ser elegíveis com a entrada em vigor do Código Eleitoral de 1932, cujo Artigo 2º assim versava:

"Art. 2º. É eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste Código."

Todavia, permaneciam impedidos de votar os mendigos, os analfabetos e as praças de pré, tal como no período da República Velha.

Para se candidatar a uma cadeira na Assembleia Legislativa de São Paulo, era preciso ser brasileiro nato, eleitor, maior de 25 anos de idade e residir no Estado há pelo menos dez anos. No caso dos deputados classistas, outra inovação do período, as condições de elegibilidade incluíam ainda o pertencimento a uma associação. Estes congressistas eram representantes de categorias profissionais, eleitos por membros dos respectivos sindicatos ou associações de classe. Em São Paulo, o total de vagas reservado a tais parlamentares era de quinze.

Tais regras, é importante frisar, disciplinaram apenas as eleições de 1934 para o Legislativo Paulista. Três anos mais tarde, em 10 de novembro de 1937, a ditadura do Estado Novo, de Getúlio Vargas, imporia um silêncio de quase uma década à Assembleia Legislativa de São Paulo.

Com a derrocada do regime autoritário, em 1945, reorganizou-se o sistema representativo. Ampliou-se o direito de voto aos maiores de 18 anos de idade, mantendo-se a exclusão dos analfabetos, dos mendigos, dos que não soubessem expressar-se na língua nacional e dos militares da ativa, com exceção dos oficiais. Também não podiam votar, é claro, os cidadãos que estivessem privados de seus direitos políticos. Para se eleger à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, o candidato tinha que ser maior de 21 anos de idade e estar em pleno gozo dos direitos políticos.

Com alterações pontuais de menor monta, esses critérios mantiveram-se intactos até 1985, quando deixou de subsistir a proibição do sufrágio para os analfabetos. A Constituição de 1988 promoveu outras mudanças, com destaque para a introdução do voto facultativo para os maiores de 16 anos e menores de 18 anos e também para os maiores de 70 anos.

No campo das elegibilidades, estabeleceu a Carta Magna os seguintes critérios, ora em vigência:

I - nacionalidade brasileira;

II - pleno exercício dos direitos políticos;

III - alistamento eleitoral;

IV - domicílio eleitoral na circunscrição;

V - filiação partidária;

VI - idade mínima de vinte e um anos (para deputado estadual).

A inelegibilidade, por sua vez, continua a se aplicar aos inalistáveis e aos analfabetos.

Como se pode perceber, nesta longa trajetória de 189 anos de existência, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo teve seus representantes eleitos de diversas maneiras, passando pelo voto censitário, a exclusão das mulheres e analfabetos e a existência dos chamados deputados classistas, eleitos por entidades sindicais e associações. Em meio às mais diversas turbulências históricas, mudanças de regime político, golpes de Estado e corajosas lutas sociais, o Legislativo Paulista é um retrato fiel dos avanços da democracia brasileira e de seu esforço de afirmação e consolidação ao longo do tempo, visando ao combate às discriminações e à permanente construção de um país com maior justiça e equidade.



Para mais informações: São Paulo (Estado). Assembleia Legislativa. Legislativo Paulista: Parlamentares, 1835-2011/ Auro Augusto Caliman [coordenador]. 4ª ed. São Paulo: Assembleia Legislativa, 2011. Disponível para consulta na Biblioteca da Alesp.

Voltar